sindrome do colon irritável

Sindrome do cólon irritável

A Síndrome do Intestino Irritável (SII) é uma condição clínica crónica que afeta o funcionamento do intestino, mesmo sem provocar alterações visíveis. Caracteriza-se por um conjunto de sintomas, cuja intensidade e frequência varia de indivíduo para indivíduo, mas que partilham uma base comum: dor e/ou desconforto abdominal, sensação de distensão (inchaço), flatulência e alterações no trânsito intestinal (diarreia, obstipação ou padrão misto). Estes sintomas podem surgir de forma imprevisível e variada, o que pode comprometer significativamente a qualidade da vida da pessoa, afetando o bem-estar físico, emocional e social.

O que se sabe sobre esta síndrome?

A SII é mais frequente em mulheres, geralmente numa idade compreendida entre os 20 e os 50 anos, e estima-se que afete entre 5% e 10% da população mundial. A sua origem é multifatorial, estando associada a alterações na motilidade intestinal, desequilíbrios na microbiota intestinal, predisposição genética, infeções gastrointestinais prévias, uso inadequado de antibióticos e fatores psicológicos como stress, ansiedade e depressão.

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é clínico e realizado pelo médico, com base na história clínica, descrição dos sintomas e exclusão de outras doenças, como doenças inflamatórias intestinais (Doença de Crohn e Colite Ulcerosa), doença celíaca ou cancro colorretal. Não existe um exame específico que confirme o diagnóstico de SII. Assim, utilizam-se critérios internacionalmente reconhecidos, como os critérios de Roma IV.

Contudo, é de salientar que em casos de presença de sinais de alarme como início de sintomas após os 50 anos, perda de peso acentuada sem causa aparente, sangue nas fezes, podem ser necessários exames complementares invasivos.

E qual o papel da Nutrição na SII?

A alimentação apresenta um papel crucial na gestão da sintomatologia da SII. Muitos indivíduos com esta perturbação desenvolvem uma hipersensibilidade a determinados alimentos, especialmente aos que contêm hidratos de carbono de cadeia curta fermentáveis, conhecidos como FODMAPs (Fermentable Oligosaccharides, Disaccharides, Monosaccharides and Polyols). Pela sua estrutura simples e baixo peso molecular, estes hidratos de carbono podem atrair água para o intestino delgado através de um efeito osmótico. Quando a sua absorção é incompleta, passam para o intestino grosso, onde são rapidamente fermentados pela microbiota intestinal. Esta fermentação origina produção de gases e aumento do volume intestinal, o que, em indivíduos com SII, pode desencadear desconforto abdominal, sensação de inchaço, flatulência e alterações do trânsito intestinal, como diarreia, obstipação ou alternância entre ambas.

A dieta com baixo teor em FODMAPs, desenvolvida pela Monash University, tem demonstrado resultados promissores na redução e controlo de sintomas da SII. Esta abordagem é dividida em 3 fases: uma fase inicial de eliminação (com duração entre 2 e 6 semanas), onde se retiram temporariamente alimentos com elevado teor em FODMAPs, substituindo por alternativas com baixo teor, de forma a reduzir a sintomatologia; uma fase de reintrodução, em que se reintroduzem alimentos ricos em FODMAPs de forma gradual e controlada (testando cada subgrupo e diferentes quantidades) para identificar possíveis intolerâncias; e uma fase de personalização, onde se estabelece um padrão alimentar personalizado, adaptado às necessidades e tolerâncias de cada pessoa, onde se reintroduzem todos os alimentos que sejam bem tolerados, enquanto os moderadamente tolerados podem ser consumidos ocasionalmente e os mal tolerados devem ser evitados, reavaliando a tolerância ao longo do tempo.

Esta dieta deve ser implementada e sempre monitorizada sob supervisão de um nutricionista, de forma a garantir a sua adequação nutricional, uma vez que quando mal implementada pode levar a restrições desnecessárias e/ou défices nutricionais.

E o stress?

A literatura refere que existe uma relação do eixo intestino-cérebro, que  desempenha um papel central nesta síndrome, uma vez que o estado emocional pode influenciar o funcionamento intestinal e vice-versa.

O stress, a ansiedade e outras condições psicológicas influenciam diretamente a sintomatologia da SII, pelo que estratégias como terapia cognitivo-comportamental, exercício físico regular e meditação podem ser benéficas.

E os probióticos?

A evidência científica sobre probióticos na SII é promissora, mas ainda variável. Os benefícios dependem da estirpe utilizada, não havendo consenso sobre uma recomendação universal. A sua utilização deve ser personalizada e orientada por um profissional de saúde. 

O impacto de uma abordagem multidisciplinar

Importa destacar que a gestão da SII deve ser feita através de uma abordagem multidisciplinar, envolvendo médicos, nutricionistas e psicólogos. Esta abordagem integrada permite tratar a pessoa de forma holística, tendo em conta não só os sintomas físicos, mas também o contexto emocional e comportamental.

A SII é uma condição real, complexa e frequentemente subvalorizada. No entanto, com o acompanhamento certo e uma estratégia adequada, é possível reduzir os sintomas e melhorar substancialmente a qualidade de vida. Se se identifica com os sintomas descritos, não hesite em procurar apoio profissional. Cuidar da sua saúde intestinal é, sem dúvida, uma forma de cuidar de si.

Para Saber mais

Se quiser saber mais sobre este tema, recomendo que ouça o episódio intitulado de “Como tratar a Síndrome do Cólon Irritável” do podcast Alimentação Saudável, da Dr.ª Mafalda Rodrigues de Almeida, com Marta Patita. Neste episódio, são abordados os principais sintomas da SII, as suas possíveis causas possíveis, os critérios de diagnóstico, o impacto do eixo intestino-cérebro e, sobretudo, a importância da abordagem nutricional, incluindo o papel da dieta baixa em FODMAPs. 

Uma conversa esclarecedora, acessível e baseada em evidência científica, especialmente útil para quem vive com SII ou acompanha alguém com esta condição.

Artigo redigido pela Nutricionista Madalena Coito

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