Devemos tomar suplementos de Vitamina D?
O tema de hoje tem a ver com a Vitamina D, que tantas pessoas têm em défice, mesmo em Portugal onde há tanto sol. As vitaminas são micronutrientes essenciais no organismo, e que têm que ser obtidos através da dieta, uma vez que não podem ser sintetizadas pelo corpo humano (1). Estas dividem-se em dois grandes grupos de acordo com um critério de solubilidade: hidrossolúveis (solúveis em água) e lipossolúveis (solúveis em gordura e por isso têm que ser veiculadas através de uma fonte de gordura alimentar) (1).
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel que se encontra presente em poucos alimentos, sendo aqueles em que se encontra em maior quantidade os peixes gordos (salmão, cavala, sardinha e atum), óleos de fígado de peixe e gema do ovo (1–3). Para além destes, a vitamina D também se encontra em suplementos alimentares e existem alguns alimentos como leite, cereais de pequeno-almoço e gorduras vegetais que são fortificados com esta vitamina, o que significa que há uma adição de vitamina D ao alimento, para que este contenha um maior teor da mesma (1,2).
A absorção desta vitamina é bastante maior quando consumida juntamente com alimentos ricos em gordura, devido à sua natureza lipossolúvel, no entanto, não está estudada qual a quantidade ideal de gordura a consumir para que seja absorvida a maior quantidade possível (1).
Contudo, a vitamina D para além de poder ser obtida através da alimentação, tem a particularidade de poder ser produzida por ação da radiação ultravioleta da luz solar na pele, sendo que se considera que esta é a forma mais eficaz para obtenção desta vitamina (1). No entanto esta produção está dependente de diversos fatores como a estação do ano, a pigmentação da pele, o uso de protetor solar, a quantidade de pele exposta e a idade, sabe-se, quanto maior for a pigmentação da pele assim como, com o avançar da idade, esta síntese vai diminuindo (1,4).
Há na literatura científica alguma controvérsia relativamente ao ponto de corte a partir do qual se considera que há uma deficiência de vitamina D, no entanto, tendo em conta os valores limite especificados pelo Institute of Medicine dos EUA (30 nmol/L) (1), os dados de um relatório europeu sugerem que a deficiência de vitamina D está generalizada por toda a Europa e que as taxas de prevalência cumprem os critérios de uma pandemia (5). Um estudo realizado em Portugal, indicou que da população idosa apresentava um nível inadequado ou deficiente de vitamina D (4).
A ingestão dietética recomendada (RDA) são 600IU por dia para a população geral e 800IU por dia para pessoas com mais de 70 anos (3,6,7). Note-se que estes valores assumem uma exposição solar mínima ou nula (6).
Para além desta, o nível máximo de ingestão tolerável (UL), ou seja, o nível a partir do qual a ingestão apresentaria riscos para a saúde, está estabelecida nos 4000IU por dia (3,6).
Os benefícios de um estado adequado de vitamina D estão amplamente estudados e descritos na literatura científica e sabe-se que, uma vez que a vitamina D promove a absorção de cálcio, e que, desta forma mantém adequadas as concentrações de fósforo e cálcio (1), um nível adequado de vitamina D no organismo parece proteger contra distorções músculo-esqueléticas (quedas e fraturas), doenças infeciosas, autoimunes, cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 1 e 2, vários tipos de cancro, entre outras (1,4).

Ao contrário do que acontece com as vitaminas hidrossolúveis, em que no caso de se encontrarem em excesso no organismo, são eliminadas pela urina, as vitaminas de natureza lipossolúvel, como a vitamina D, não conseguem ser eliminadas dessa forma, sendo acumuladas quando se encontram em excesso no corpo humano. Se esta acumulação for em grande quantidade, pode levar a uma hipervitaminose, que ocorre quando a vitamina atinge um nível tóxico no organismo o que pode trazer danos renais e cardiovasculares (1).
É importante ressalvar, que é bastante improvável e difícil chegar a um estado de hipervitaminose, apenas através do consumo de alimentos, sendo, a toma de suplementação indevida a causa mais frequente. Sabe-se também que através exposição solar prolongada não é possível atingir níveis tóxicos de vitamina D (1).
Tendo em conta que os alimentos que contêm vitamina D são limitados e muitos, são consumidos esporadicamente, os suplementos e alimentos fortificados surgem como uma alternativa para atingir a ingestão recomendada (8). Tem sido crescente a utilização de suplementos alimentares no entanto, um estudo realizado em 2012 demonstrou que 90% da população que utilizava algum tipo de suplemento com vitamina D, fazia-o numa dose inadequada (9).
A suplementação de vitamina D está indicada para casos específicos como é o caso de adultos com deficiência comprovada, síndrome de má absorção, insuficiência renal crónica e situações de maior gravidade clínica como osteoporose ou fraturas (3), sendo que outros casos devem ser avaliados individualmente por um profissional de saúde habilitado. Para além disto, considera-se que apesar dos suplementos alimentares poderem ser uma via para o aumento do consumo de vitamina D, os alimentos fortificados representam um melhor custo-benefício (9).
Atualmente não há nenhuma recomendação que indique benefício no uso de suplementos de vitamina D contra COVID-19, mesmo tendo em conta a diminuição da exposição solar na situação de quarentena.
Por fim, é importante deixar claro que a toma de suplementos alimentares ricos em vitamina D não é estritamente necessária, uma vez que é possível atingir a ingestão recomendada através da alimentação ou exposição solar e que, no caso de suplementação esta não deve nunca ser realizada sem o acompanhamento por um profissional de saúde habilitado, podendo correr o risco de estar a suplementar sem necessidade e em doses inadequadas (3).
Artigo escrito por Clara Magalhães Dias, Nutricionista.
Bibliografia
1. Institute of Medicine. DRI – Dietary Reference Intakes – Calcium Vitamin D. Vol. 356, Comptes Rendus Mathematique. 2018. 75–1061 p.
2. McCourt A, McNulty BA, Walton J, O’Sullivan A. Efficacy and safety of food fortification to improve Vitamin D intakes of older adults. Nutrition [Internet]. 2020;110767. Available from: https://doi.org/10.1016/j.nut.2020.110767
3. DGS. Prevenção e Tratamento da Deficiência de Vitamina D. Vol. 25, Norma 004/2019 de 14/02/2019. 2019. p. 1–26.
4. Santos A, Amaral TF, Guerra RS, Sousa AS, Álvares L, Moreira P, et al. Vitamin D status and associated factors among Portuguese older adults: Results from the Nutrition UP 65 cross-sectional study. BMJ Open. 2017;7(6):1–13.
5. Cashman KD, Dowling KG, Škrabáková Z, Gonzalez-Gross M, Valtueña J, De Henauw S, et al. Vitamin D deficiency in Europe: Pandemic? Am J Clin Nutr. 2016;103(4):1033–44.
6. Manson JE, Brannon PM, Rosen CJ, Taylor CL. Vitamin D Deficiency — Is There Really a Pandemic? N Engl J Med. 2016;375(19):1815–7.
7. Lin KW. Vitamin d screening and supplementation in primary care: Time to curb our enthusiasm. Am Fam Physician. 2018;97(4):226–7.
8. Black LJ, Walton J, Flynn A, Cashman KD, Kiely M. Small Increments in Vitamin D Intake by Irish Adults over a Decade Show That Strategic Initiatives to Fortify the Food Supply Are Needed. J Nutr. 2015;145(5):969–76.
9. Kiely M, Black LJ. Dietary strategies to maintain adequacy of circulating 25-hydroxyvitamin D concentrations. Scand J Clin Lab Invest. 2012;72(SUPPL. 243):14–23.