Dieta Cetogénica – será uma boa abordagem?
A dieta cetogénica é uma dieta em que a distribuição dos macronutrientes é feita de forma a que a quantidade de gordura consumida seja alta, a de proteína moderada e a de hidratos de carbono muito baixa. Este conceito surgiu primordialmente no início do século XX, como uma derivação do jejum prolongado para o tratamento da epilepsia, onde um estudo chegou à conclusão de que as convulsões destes doentes eram menos críticas quando seguiam este regime alimentar (1).
Quando a alimentação não suprime o teor de hidratos de carbono, o corpo converte-os em glucose – a principal fonte de energia do cérebro. Por outro lado, quando o teor de hidratos de carbono é muito reduzido ou nulo, como é o caso de um período de jejum, as reservas de glicogénio – hidratos de carbono armazenados no fígado e músculo – são diminuídas e o corpo passa a utilizar gordura como fonte de energia, e esta é convertida em corpos cetónicos pelo fígado. Desta forma, o processo de cetose inicia-se devido à baixa ingestão de hidratos de carbono, e não, devido à elevada ingestão de gordura. Apesar da quantidade máxima de hidratos de carbono para a indução de cetose variar de pessoa para pessoa, a média são cerca de no máximo 50 gramas por dia. Desta forma, alimentos como pão, cereais, leguminosas e frutas são excluídos neste tipo de dieta.
Desde o século XX, vários estudos têm vindo a demonstrar que quando os corpos cetónicos se encontram elevados, há uma redução bastante significativa de convulsões epiléticas em crianças, sendo num dos primeiros estudos realizados, cerca de mais de 50% das crianças e jovens apresentaram melhorias no controlo da doença (2,3). No entanto, a adesão a este tipo de dieta tem demonstrado ser bastante difícil devido às restrições alimentares que acarreta, levando a um taxa de abandono superior a 50%, e por isso, não é vista geralmente, como uma primeira linha de controlo da doença (4), para além disto, estudos mais recentes também demonstraram que apesar de poder ser uma dieta válida em crianças, existe falta de evidência quanto aos seus benefícios, havendo nos adultos um desconhecimento ainda maior (5).
Dentro da dieta cetogénica, têm vindo a surgir cada vez mais, diferentes variações e para diferentes fins do que apenas para o controlo da epilepsia, sendo que atualmente, o principal motivo que leva muita gente a seguir este tipo de regime alimentar, é a perda de peso. Vários estudos têm sido feitos no sentido de perceber se existe alguma vantagem em seguir dietas pobres em hidratos de carbono, e o que se verificou é que este tipo de dietas promove uma perda inicial de peso mais rápida, no entanto, esta não se deve à custa da perda de gordura mas sim, da perda de água e que, apesar do estado de cetose promover a perda de apetite, o que poderá facilitar todo o processo, é geralmente uma dieta bastante rica em gorduras saturadas e baixa em vitaminas, minerais e fibra. Para além disto, tal como os primeiros estudos realizados, estes, mostram que não é uma dieta prática para seguir no longo prazo por ser demasiado restrita e rígida (6).
Quando se compara uma dieta pobre em hidratos de carbono com uma dieta pobre em gorduras, aquilo que se verifica é que existe uma perda inicial de peso maior com a dieta pobre em hidratos de carbono, principalmente nos primeiros 6 meses, mas que ao final de 1 ano, os dois tipos de dieta levam a uma perda de peso semelhante (6), sendo que nenhuma estratégia parece ser superior e que as pessoas não respondem todas da mesma forma, o balanço energético negativo, através da restrição calórica, é a premissa fundamental de qualquer estratégia bem sucedida de perda de peso, seja esta conseguida através da redução de hidratos de carbono, gordura ou jejum (7). Em última instância, a melhor dieta é aquela que a pessoa conseguir manter o tempo suficiente para alcançar os seus objetivos de perda de peso e posteriormente de manutenção.
A dieta cetogénica também tem sido amplamente estudada no controlo da diabetes tipo 2, uma vez que, os hidratos de carbono são o macronutriente que leva a um maior aumento da concentração da glucose e insulina após as refeições e o que a evidência científica tem demonstrado, é que de facto, existe uma melhoria no controlo da doença a curto prazo, mas que, a médio e longo prazo não parecem existir diferenças significativas quando comparada com outro tipo de estratégias nutricionais (8). No caso da diabetes tipo 1, a dieta cetogénica não é de todo recomendada, dado o elevado risco de provocar cetoacidose diabética nestes doentes, uma vez que a quantidade de cetonas produzidas pelo fígado em indivíduos com diabetes tipo 1 é bastante mais elevada do que aquelas produzidas por indivíduos saudáveis (9).
Em suma, a dieta cetogénica é muitas vezes vista como uma boa alternativa para pessoas que têm pressa em perder peso, no entanto, esta não inclui um processo de reeducação alimentar por ser demasiado restritiva e pode mais tarde, levar ao efeito yo-yo, voltando a ganhar todo o peso perdido novamente. Para algumas patologias específicas esta parece ser de facto uma opção a considerar, no entanto, a evidência científica não é ainda muito clara. Veja neste artigo algumas sugestões de receitas saudáveis e equilibradas que poderá fazer o ajudar a perder peso.
Artigo escrito por Clara Magalhães Dias, Nutricionista.
Bibliografia consultada:
1. Wheless JW. History of the ketogenic diet. In: Epilepsia. 2008. p. 3–4.
2. Vining EPG, Freeman JM, Ballaban-gil K, Camfield CS. A Multicenter Study of the Efficacy of the Ketogenic Diet. JAMA Neurol. 1998;55:1433–7.
3. Freeman JM, Vining EPG, Pillas DJ, Pyzik PL, Casey JC, Kelly MT, et al. The Efficacy of the Ketogenic Diet — 1998 : A Prospective Evaluation of Intervention in 150 Children. Pediatrics. 1998;102(6).
4. Klein P, Tyrlikova I, Mathews GC. Dietary treatment in adults with refractory epilepsy : A review Dietary treatment in adults with refractory epilepsy: A review. Neurology. 2014;
5. Kj M, Bresnahan R, Rg L, Pn C, Kj M, Bresnahan R, et al. Ketogenic diets for drug-resistant epilepsy: Review. Cochrane Database Syst Rev. 2020;(6).
6. Bray GA, Siri-Tarino PW. The Role of Macronutrient Content in the Diet for Weight Management. Endocrinol Metab Clin North Am. 2016;45(3):581–604.
7. Thom G, Lean M. Is There an Optimal Diet for Weight Management and Metabolic Health? Gastroenterology [Internet]. 2017;152(7):1739–51. Available from: http://dx.doi.org/10.1053/j.gastro.2017.01.056
8. Snorgaard O, Poulsen GM, Andersen HK, Astrup A. Systematic review and meta-analysis of dietary carbohydrate restriction in patients with type 2 diabetes. BMJ Open Diabetes Res Care. 2017;
9. Kanikarla-marie P, Jain SK. Hyperketonemia and ketosis increase the risk of complications in type 1 diabetes. Free Radic Bio Med. 2016;95:268–77.